Quando analisamos as deformações em edificações de concreto armado, verificamos as deformações indicadas na Grelha – ELU, para edifícios lançados no Modelo IV, ou no GRELHA – ELS, para edifícios lançados no modelo VI.
A imagem abaixo é de uma Grelha – ELS de um projeto lançado no modelo VI. Verifiquem que a deformação na ponta do balanço é de 4,3cm, para o caso de carregamento ELS:
Em edifícios que utilizam concreto protendido, fazemos essa análise após o detalhamento das faixas protendidas e do processamento do hiperestático. Visualizando a deformação em um caso de carregamento que envolva as forças de alívio devido à protensão, notamos que a deformação é muito menor, da ordem de 0,8cm, como se vê na figura abaixo:
Obviamente isso depende das forças de protensão adotadas e da geometria dos cabos, mas mostra que a protensão tem um efeito excepcionalmente benéfico no controle das deformações. Mas esse não é o tema central deste artigo.
O tema central é: mas e em um edifício Pré-Moldado? E em um edifício pré-moldado e protendido?
As análises feitas pelo Software TQS são feitas a partir de um modelo de barras, que têm suas características geométricas e físicas determinadas pelas seções dos elementos estruturais adotados no modelo. Seja ele um edifício moldado in-loco ou pré-moldado.
Quando lançamos uma viga de, por exemplo, 20x60 cm com 30 Mpa de fck, o Software vai adotar uma barra de inércia e material equivalente, utilizará essa barra para determinar a rigidez de cada elemento, calculará seus esforços e, por consequência, determinará a deformação da barra para cada caso de carregamento.
Um edifício pré-moldado não pode ser analisado dessa forma, salvo o edifício ser totalmente articulado, sem a consideração de solidarização nas vigas. Isso porque, no edifício pré-moldado, existem etapas de construção que precisam ser analisadas isoladamente.
Um caso típico desse tipo de edificação são Pipe-Rack’s: estruturas utilizadas para servir de suporte para tubulações industriais.
Quando as vigas utilizam uma capa de concreto, geralmente proveniente do capeamento utilizado nas lajes, elas possuem uma seção final composta pela peça pré-moldada em si, mais o concreto do capeamento. Chamamos essa seção de seção solidarizada.
A figura abaixo representa apenas a seção pré-moldada. Essa é a seção que será montada na obra. Ela tem uma inércia de 267.842cm4.
É sobre essa seção, com essa inércia, que atuará o peso próprio da estrutura mais o peso próprio das lajes e mais o peso próprio do capeamento. Estas cargas atuam na peça que, neste momento, está bi-apoiada.
Quando o concreto utilizado no capeamento das lajes é lançado, fresco, ele atua na estrutura apenas como carga atuante.
Análise deformações
Após o concreto do capeamento “curar” e endurecer, ele forma a seção solidarizada, cuja inércia é de 1.164.420 cm4. É uma inércia 4,25 vezes maior!
É muito comum, após a solidarização, transformar uma viga bi-apioada em uma viga engastada, como se fosse concreto in-loco, utilizando emendas por luvas.
Essas luvas permitem que surjam momentos negativos nos apoios, o que modifica as condições de apoio das extremidades, diminuindo muito a deformação, em função do aparecimento de momentos negativos, que aliviam os momentos positivos.
Com momentos positivos menores temos deformações menores e, aliados a isso, esses esforços menores atuam em barras com inércias muito menores!!
Após abordar estes temas, vamos verificar como o TQS faz a análise das deformações de modelos de estruturas pré-moldadas.
O TQS separa o edifício em quantas etapas forem necessárias, acompanhando a sequência de montagem do mesmo. Fazendo uma análise de uma estrutura simples, que será montada sem emendas de pilares, podemos dividir o modelo em 2 etapas:
1) A etapa acabada, com a estrutura solidarizada, onde atuarão as cargas totais da estrutura;
2) A etapa de montagem, com a estrutura articulada, onde atuam apenas o peso-próprio dos elementos.
O TQS monta, assim, 2 edifícios independentes, dentro do mesmo edifício. Um para cada etapa. Ele faz o processamento dos dois edifícios e fornece os esforços em cada barra para cada um dos modelos.
Ele processa primeiramente a Etapa Acabada e depois processa as Etapas de Montagem, na sequência determinada nos dados do edifício.
O software usa a inércia apenas da seção pré-fabricada na montagem do pórtico e grelhas das Etapas de Montagem e utiliza as inércias das seções solidarizadas na Etapa Acabada.
A imagem abaixo é de uma edificação simples, pré-moldada.
Dentro da Etapa acabada, vamos até grelha de um dos pavimentos e visualizamos a deformação dentro do caso de carregamento ELS:
Notem que a deformação informada é de 3,4cm, no caso de carregamento ELS.
Agora, se formos à etapa de montagem e verificarmos o mesmo ponto, veremos que a deformação na mesma viga é de 9,1cm!!!!!
Essa deformação inicial, que atua na seção pré-fabricada durante a montagem da estrutura é IRREVERSÍVEL!
Como pode então o Software indicar que a deformação final da peça é de 3,4cm?
Quando as vigas utilizam uma capa de concreto, geralmente proveniente do capeamento utilizado nas lajes, elas possuem uma seção final composta pela peça pré-moldada em si, mais o concreto do capeamento. Chamamos essa seção de seção solidarizada.
Como disse, quando o software separa os modelos, os torna independentes. Ele lança os carregamentos atuantes nas barras que tiveram sua seção definida no modelo, processa cada modelo independentemente.
Vejam na imagem abaixo que no modelo da estrutura acabada, solidarizada, ele até mostra a etapa de “Peso próprio articulado”, mas considera a inércia da seção solidarizada, o que é um equívoco, visto que o peso próprio atua na seção pré-moldada apenas, que tem uma inércia muito maior!
Ele informa que a deformação devido ao peso próprio é de apenas 2,1cm, quando vimos que, na verdade, ela é de 9,1cm.
A forma correta de analisar a deformação de estruturas pré-fabricadas é a seguinte:
1) Verificar a deformação devida ao peso próprio do elemento analisado na etapa de montagem;
2) Verificar a deformação devida às cargas permanentes e acidentais do elemento analisado na estrutura acabada;
3) Somar algebricamente os 3 valores.
No caso em análise, temos:
a) Deformação devida ao peso próprio na Etapa de Montagem: 9,1cm
b) Deformação devida à carga permanente na Etapa Acabada: 0,8cm
c) Deformação devida à carga acidental na Etapa Acabada: 0,7cm
Assim, fazemos a combinação desejada (PP + Permanente + 0,6 Acidental) e chegamos à uma deformação de 10,32cm.
A deformação total indicada na Etapa Acabada é de apenas 3,4cm.
É óbvio que uma peça com essa deformação é inadmissível, mas a mesma pode ter uma deformação bem menor caso utilizemos protensão.
O que queríamos mostrar neste artigo é que a deformação em estruturas pré-moldadas precisa ser analisada com critério é não simplesmente aceitar aquilo que o software nos informa.
Autor: Márcio Cunha, professor no International Master em Estruturas de Edificações.